A poetisa aproveita o tempo dos semáforos fechados para vender suas poesias. Foto: Wagner Oliveira

Sinal aberto para o sonho de Lenemar

Lenemar Santos é daquelas pessoas que não desistem dos seus sonhos. Quando ainda era criança, já sabia que queria ser escritora. Cresceu amando os contos e os livros. Leu obras de Clarice Lispector, Olavo Bilac, Cora Coralina e outros mestres da literatura. Passava horas lendo e descobrindo o mundo através das letras.

A partir daí, o local de trabalho dela passou a ser as ruas e avenidas com grande movimentação de carros, mais precisamente nos sinais de trânsito instalados nesses endereços. Com sacrifício e contando com a ajuda de amigos, ela conseguiu imprimir alguns livretos com suas poesias.

Com o material em mãos e muita expectativa, Lenemar começou a sair todas as noites para vender seu trabalho. Logo passou a ser conhecida como a Poetisa do sinal. E a luta para realizar o sonho de ser escritora e viver da sua arte estava apenas no começo.

Lenemar Santos vende seus trabalhos em sinais de trânsito há 15 anos. Fotos: Wagner Oliveira
Lenemar Santos vende seus trabalhos em sinais de trânsito há 15 anos. Fotos: Wagner Oliveira

Neste 20 de novembro, quando é celebrado o Dia Consciência Negra, o blog Bodega de Notícias, que “nasce” hoje, traz a história de luta e resistência dessa jovem escritora. Essa data marca a morte de Zumbi dos Palmares, um dos símbolos nacionais pela resistência à escravidão e enfrentamento ao racismo. Em 2023, o Congresso Nacional aprovou a lei que transformou o Dia da Consciência Negra em feriado nacional. Nesta quarta-feira, é a primeira vez que a data será comemorada em todo o país. 

Bom, mas agora vamos voltar a falar da nossa personagem. Natural da cidade de Gameleira, na Mata Sul pernambucana, e de família pobre, foi somente aos 22 anos, e depois da morte da mãe, que Lenemar começou a percorrer seu caminho nas artes. Encontrou muitas dificuldades, mas segue firme até hoje.

Em 2003, quando foi morar na casa de parentes, em Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, Lenemar chegou com o pensamento de que seria fácil realizar seu sonho, mas logo enxergou que não era tão simples assim. Precisava trabalhar para se manter. Foi garçonete e ajudante num salão de beleza, mas nada disso a fazia feliz e realizada.

Lenemar também aborda clientes fora dos sinais. Foto: Wagner Oliveira
Lenemar também aborda clientes fora dos sinais. Foto: Wagner Oliveira

Então, passou a escrever e declamar suas poesias em sinais de trânsito e em bares. Porém, ainda não era isso que a jovem poetisa buscava. “Aquilo não estava me satisfazendo. Eu queria mesmo era escrever e vender minhas poesias. Foi quando comecei a fazer os livretos”, lembra.

Quando encontrei com Lenemar pela primeira vez, ela vendia suas poesias num semáforo no bairro de Prazeres, no horário da noite. Isso foi no ano de 2009. A entrevistei para os jornais Diario de Pernambuco e Aqui PE. Os perrengues já eram muitos e não acabaram.

A história de Lenemar já foi contada por mim em matérias publicadas em 2009. Foto: Arquivo
A história de Lenemar já foi contada por mim em matérias publicadas em 2009. Foto: Arquivo

“Alguns ocupantes dos carros nem baixavam os vidros para escutar o que eu estava dizendo. Ainda é assim hoje e é assim desde quando comecei a trabalhar nos sinais. Mas eu não penso em desistir. Eu amo o que eu faço. Também já tive problemas com alguns menores que ficavam em sinais vendendo seus produtos ou pedindo dinheiro”, conta.

Hoje, aos 36 anos, Lenemar está prestes a lançar seu segundo livro, “Mulheres da vida real”. A obra, segundo a poetisa, reúne histórias de mulheres nordestinas, sobretudo mulheres jaboatonenses.

“É uma biografia dessas mulheres que são fortes e defendem a cultura e a arte. O livro vai retratar as vidas de professoras, produtoras culturais, psicólogas, e muitas outras mulheres. Estamos na reta final para finalmente encaminhar para edição e, muito em breve, fazer o lançamento, mas ainda não tenho uma data prevista”, revela. O primeiro livro lançado por Lenemar foi “Na pele”, a edição está esgotada.

A poetisa aproveita o tempo dos semáforos fechados para vender suas poesias. Fotos: Wagner Oliveira
A poetisa aproveita os semáforos fechados para vender suas poesias. Foto: Wagner Oliveira

Para levar sua arte e seu trabalho a cada vez mais pessoas, Lenemar costuma se reunir com amigos também artistas para fazer saraus e participar de eventos em diversos bairros do Grande Recife.

“São poetas, poetisas e cordelistas. A gente está em feiras, encontros, realizamos palestras em escolas, recitamos poesias em bares e em qualquer lugar onde tenha cultura. Em 2016, eu e meu amigo Toni Borba criamos o movimento Sarau da Gente para que nossa arte siga firme e forte. As pessoas precisam ler. A leitura é muito importante e não vamos desistir de propagar cultura e conhecimento”, destaca.

A poetisa aproveita o tempo dos semáforos fechados para vender suas poesias. Fotos: Wagner Oliveira
Além das abordagens nos sinais, Lenemar também participa de eventos. Foto: Wagner Oliveira

Entre os temas tratados na poesia de Lenemar têm destaque a cultura nordestina, a violência contra as mulheres, o preconceito e o racismo. Lutadora e sonhadora, Lenemar enfrenta as dificuldades da vida vendendo aquilo que ama fazer. Poesia. Se você não teve a sorte de encontrá-la em algum sinal de trânsito, pode contribuir doando qualquer valor através do Pix: 99782.3275. Esse número também é o WhatsApp de Lenemar.

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